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29 abril 2015

ESTE ADMIRÁVEL ANTERO GRECO // ESTADÃO

A sentença de Jobson


Antero Greco

Jobson é bom jogador, tem qualidade como tantos milhares de jovens brasileiros que aproveitam o dom para lidar bem com a bola e com ela ganham a vida. Está distante do patamar dos craques, embora meio degrau acima da média de muitos companheiros de profissão. Dentro das limitações atuais do Botafogo, ocupa papel de destaque.



Ao mesmo tempo em que procura safar-se de botinadas de marcadores duros, trava combate contra dependência química. O futebol ajuda Jobson, 27 anos, a driblar a onda que há muito ameaça tragá-lo e que já o colocou no desvio algumas vezes.

A Fifa agora dá uma força para que Jobson afunde na vagalhão das drogas ou, no mínimo, perca o rumo e a profissão. A entidade que manda no esporte mais popular do mundo decretou sentença inclemente contra o rapaz, ao puni-lo com quatro anos de suspensão porque se negou a fazer exame antidoping em 2014, quando ainda jogava pelo Al Itihad, da Arábia Saudita.

Crime inafiançável para os sentinelas do fair play instalados em atapetadas salas na Suíça. Guardadas as devidas proporções, a entidade agiu como se fora inspirada por leis da Indonésia. Sentença draconiana, contra a qual ao menos se espera o benefício do apelo.

A desgraça de Jobson, como a de tantos rapazes, esportistas ou não, está dentro de si mesmo. Talvez nem ele saiba os motivos que o levaram a conviver com substâncias corrosivas de corpo e alma. Mas é a realidade - doída, feia e que tenta enfrentar. Relatos de dependentes são de cortar o coração. Assim como são tristes as confissões de quem se bate para ficar longe do alcoolismo ou qualquer obsessão.

Redundante gastar espaço a respeito das alternativas para lidar com a questão. Quem conhece casos semelhantes sabe que não cabem considerações filosóficas, nem moralismo tampouco comiseração rasteira. Mas fato é que pessoas nessa situação têm o direito de levantar-se tantas vezes quantas caírem. Não há um limite para ajuda, não existem regras imutáveis, pois se está sempre a lidar com gente.

Pois para a Fifa, sim. Jobson recebeu condenações anteriores por uso de cocaína, não tem ficha limpa, e o prontuário talvez tenha pesado. Mas contou pra valer o relatório enviado pela Comissão Antidoping do futebol árabe. Por lá, episódios desse tipo redundam em penas de quatro anos para quem testa positivo ou para quem não aceita colher material - caso de Jobson. A papelada é enviada para os escritórios suíços, alguns engravatados o referendam e distribuem o comunicado para os associados até chegar ao jogador.

A alegação para o rigor é o combate ao doping, malefício que todos com bom senso desejam ver banido do esporte. Daí, volta a polêmica recorrente e interminável: o que exatamente é doping? Há correntes na ciência que negam vantagem para quem, por exemplo, usa maconha. O rendimento do sujeito tende a cair, ou seja, surge reação oposta de quem procura estimulantes para alcançar melhores marcas.

Os profissionais do doping sabem como mascará-lo, assim como atletas mal-intencionados ou ignorantes aceitam ingerir qualquer coquetel químico que os torne mais competitivos. Repare como os que são flagrados por combinações requintadas têm pronta a defesa: trocaram a urina ou o sangue, os tubos estavam contaminados, o laboratório errou, a farmácia que prepara suplemento vitamínico foi descuidada, e assim por diante. Não raro com olhar complacente de dirigentes, patrocinadores, torcedores, mídia.

Jobson não tem marketing, medalhas ou carisma para atuar como garoto-propaganda. Não "vende", não desequilibra competições; quase um zé-ninguém. A história dele é tão comum e reles como a que vemos todos os dias: origem humilde, do interior do Brasil, arrimo de família, pouca instrução, más companhias, deslumbramento com a fama, vício. Roteiro pronto para fim desastroso.

Jobson não tem a má fé de quem se dopa. Se a Fifa considera o futebol "família", deve olhar por esse filho. 

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