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21 agosto 2007

O bar e um piano nos anos 70 SRebouças JUL70

Eu quisera que todos vocês se sentissem, súbitamente, imersos no mistério de luz e sombra, ao redor de seus copos louras lágrimas a escorrer, em suas mesas já tão marcadas e prostituídas nestas tantas noites, ao redor seus problemas, tão iguais, a percorrerem sentados o trottoir de suas decepções em luz e sombra, ouvindo a música romântica do piano de um cego...
É noite, e este papo manso e enganador que nos faz esquecer as horas, nesta mesa num bar avarandado em Copacabana, os sons cada vez mais próximos do cochichar: destination bed.
Eu quisera que todos vocês destilassem súbitamente a azia de uma discordância, ao redor dos fatos estabelecidos que-são-assim-e-assim-serão, mas, por favor, não se trata de política, que é neste cenário ocupação menor...
De repente, não sei se foi a música, ou se foram os toques repetidos de nossos dedos, em torno de nossas cervejas, olho no olho, querença bilateral expressa na rouquidão das nossas vozes, o buerburinho abafado de outros confessionários à volta, o mastigar em uníssono das batatinhas a lembrar o cocheiro a estimular os cavalos a correr, mas eu senti dentro de mim naquele momento a justificativa que só o efêmero pode trazer ao ser humano em instantes maníacos de felicidade.
Só a música, e um mil folhas de intenções - não drogas, não álcool em excesso, nada artificial, pois ali tudo mostrava-se absurdamente real, na irrealidade quotidiana de nossas existências.
Decepções e expectativas que se revezavam, agora reduzidas à expressão menor, a música entrecortando, recheando, instigando, chamando, insistindo, proclamando, traduzindo e arrebatando mesmo que em segundo plano.
E éramos todos fantoches quase ébrios de felicidade e ilusão, escravos daquela música, música que até hoje, na memória, eu canto, assobio, sonho, canto, assobio, sonho, única música que consegui reter entre tantas que passaram em minha vida: resultante para onde caminharam as minhas lágrimas de alegria e tristeza, o meu espanto à beleza do sol, sempre que surge no horizonte, e o meu sempiterno medo pânico do escuro....


Um comentário:

  1. Bem, tu escreves mesmo bem. Leio e penso que consigo ver/sentir o que descreves.

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